segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Bandeira Branca

Hoje escapa-se-me a vida.
Sinto-a cada vez mas lenta nas minhas veias,
Cada vez mais escassa no meu espírito.

Os amores de cada um são variados,
Sucessos um luxo.
De todos os meus amores,
Tive os meus luxos ou luxúrias.

Quem sabe onde estão agora!
Que armadilha é esta que me dá tudo num dia
E me acorrenta no seguinte?

Não encontro mais ferramentas,
Não sei dos sossegos e confortos.
Não sei das forças nem das armas.

Sou uma fraca de armadura posta, 
Sou uma desarmada guerreira.

Sou as obras sem visão...
A visão do meu falhanço.

sábado, 21 de novembro de 2015

Porque te apraz tanto o vazio?
Porquê mirar à distância 
O fruto do teu desejo
Quando ele secretamente se oferece
A ti todos o dias?

Porquê o "não ser",
O "não estar", o "não querer"?

É tua a estafeta desta etapa,
És tu...

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Até onde vai a existência?
De onde a onde se mede?

Tudo o que dizemos, criamos,
As pessoas em que existimos, ...
Será isso a continuação
Da nossa existência?

Será possível sair deste poema 
E agarrar-te pela mão para que fiques?
Será que dá para ficares
Mesmo que tenhas de ir?

Como se enche o buraco sem ti?
Como se faz paz com a inexistência de ti?

Há existências que nunca deviam ir.
Confiei que sempre lá estariam
E neste momento, não há discurso
"Do correr da vida" que me convença.

Tu que me abriste portas e os olhos,
Tu que me deixaste um bilhete de comboio na mão,
Tu que fizeste de museus rebuçados aos meus olhos de criança,
Tu que me mostraste os nossos poetas e pintores,
Tu que me escutaste toda música e toda eu,
Produto muito do teu dedo de fada madrinha.

Vais ter de continuar a existir.
Existências como a tua não desaparecem.

Nós não conhecemos
O correr dos dias sem ti.
Ensina-nos!
Mas só se tiver de ser.

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Da verdade e da honestidade

Honestidade é pão de ricos.
Não se serve à mesa de podres de espirito.

Honestidade é a moeda dos nobres e sábios.
Não é perícia, é coragem.
É a mão firme piedosa da palavra necessária,
no momento doloroso.

Temer a verdade é temer a fome.
Nada vive sem alimento
E o do espírito é o mais esquecido.
Verdade é sina dos justos.

Temendo a honestidade,
vive-se a metade dos sentidos.
Tudo é máscara e dor anunciada.
Já dizia o poeta jornaleiro,
"De nenhum fruto queiras só metade".

Honestidade é a recusa
do sofrer adiado, próprio ou alheio.
Engano e indiferença são a morte lenta
do sonho, da fantasia.

A longa estrada da espera,
a recta que não dobra nem pára.
Porque me mentes e omites?
Não há atalhos no engano.
Sofrimento meu, assunto meu.
Não há sossego no esquecimento.
Não há sorrisos imaginados
na cara que não se mostra.
Não há verdade nas palavras não ditas
Nem honestidade no desaparecimento.

sábado, 26 de setembro de 2015



Eu sou a companhia de ninguém,
O grito num cemitério 
E a sede de água salgada.
De mim, o tempo, o suor e as lágrimas,
Para mim, só as horas de expediente,
Os dias úteis.
Aceito-me neste desprezar ignorado.
Vejo-o e ele entranha-se.
É uma nuvem barulhenta!
Queria fazê-la chover e desaparecer,
Mas este Outono não quer acabar.

sábado, 19 de setembro de 2015

Iam sentadas lado-a-lado.
A noite e a escuridão,
A tristeza e a folia.

Que perfeita e real metáfora 
No vagão daquele comboio.
Podiam ser a mesma pessoa,
À inconstância de quem se permite sentir.
Duma nem somente o olhar tinha sentido ou direção,
A outra não tentava nem disfarçar o sorriso. 

Uma era a sombra da morte escutada, ascoltada,
A outra a apoteose do êxtase.
Seguramente veria o objeto de tal êxtase em breve.
Não sabia sequer se era a noção da sua existência
Ou a ânsia do eminente reencontro 
Que lhe arrancavam aquele brilho!

A outra não queria que o tempo rolasse.
Pedia aos momentos todos do dia para ser redimirem.
Pedia-lhes que não fossem ambiciosos.
Pedia-lhes mais um dia, um dia passado.

O tempo nem existe e nós contamo-lo.
Voa nos dias dos risos,
Arrasta nos dos tormentos.
Não há cura e aceitar não é nem redenção.
Aceitar é desculpa, é pretexto,

Nada muda,
Uns dias uma, outros a outra,
No vagão daquele comboio.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Ser alguma coisa


Diz que é difícil ser-se alguma coisa.
Difícil não é sentar e ser,
Não é ter a imagem dessa coisa 
E personificá-la.

Difícil é querer o suficiente.
Difícil é não perder o norte sem GPS.
Difícil é aceitar os quereres dum corpo
Que cresce e não quer regras.
Difícil é ser inteiro.

Regressos e despedidas arrancam-nos pedaços,
Começos implicam uma existência assimilada.
Que quereres, que coisas sobrevivem aos adeus?

Sorte de quem quer e é,
A coisa para que nasceu.

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Os dias contam-se porque acabam.
É preciso medir a existência.

Não obstante, é nosso todo o entretanto.
Todos os momentos despertos
E os adormecidos também.

Não há medida para o alcance da força
Da alma determinada,
Nem que apenas levantada de uma queda maior.

São estes versos longos e estrofes curtas
Que me dão escape a esta madrugada.

Chuva de primavera indecisa,
Qual metáfora dos meus dias não realizados.

Será tarde?

domingo, 17 de maio de 2015

De elástico entrelaçado
No teu desajeitado cabelo cor de fogo,
Vi-te no luxo da bagunça
Em que me aceitavas
E na tristeza da tua silhueta
Fazendo-se pequena na distância
Em que que desapareceste.

Não havia portas à nossa volta.
A tua mão não obedecida ao protocolo
E os teus lábios só conheciam vontades.

Não havia portas à nossa volta.
O mesmo sossego que te trouxe,
Levou-te e libertou-te.
Eu sou a prisão de me doar,
A fugida possível que não experimentaste.

16.Maio.2015.

sábado, 28 de março de 2015

Perdão, mas hoje não posso.
Estou ocupada a nascer de novo.

Fui ali à mercearia da esquina,
Encontrei umas cerejas rosadas
E eram talvez a coisa
Mais colorida daquele dia.
Não sabiam a veludo nem seda.
Eram de cor amargura,
De cheiro solidão.

Mas trouxe-as no cesto.
Mastiguei a sua amargura
E engoli a sua solidão.
Foi o princípio da minha cura.

Perdão, hoje não vou.
Estou ocupada a sentir pena de mim.

Tentei as outras formas
A força, a glória, a modéstia e a humildade.
Mas acordei sempre na mesma pele.
Fugi do desgosto último
E só encontrei meias curas.

Por isso, hoje não posso.
Peço perdão.

Só do fundo ou do topo
Nascem os poemas.
Só do excesso e
Do choro e das cerejas,
Esperemos,
Virá algum sossego da tua partida.

quarta-feira, 18 de março de 2015

As tuas mãos eram penas.
Como penas ofereceram-me
O imediato aconchego
Que segundos depois o medo
Te roubou a ti e a mim.

Um dia o vento chegou e inebriou-te.
Como vieste, foste...
Foste porque ficando não podias ser
E sendo não sabias ficar.

Mas eu gostava que fosse diferente.
Que as folhas não caíssem das árvores
E que cada estação não fosse um adeus.
Tu és um adeus duro.

Não há verdade sazonal
Em planícies eternas.

sábado, 31 de janeiro de 2015

Se não for para a amar,
Que me fuja a luxúria.

Se não for para a acordar
com um beijo na testa,
Que nunca adormeçamos no mesmo leito.

Se não for para chorar por dentro,
A cada largar da sua mão,
Que não anseie o luxo do seu toque.

Se não for para embebedar-me do seu cheiro,
Que o leve o vento para longe sempre.

Se for para ver suas lágrimas,
Que se ceguem meus olhos.